Na benção do Caminho do Tejo
Discurso de Helena Vaz da Silva na inauguração do Caminho do Tejo, em maio de 2000
Uma peregrinação é sempre um momento importante na vida. É um momento de descoberta de uma nova maneira de olhar em volta ou de uma nova maneira de olhar para dentro. Por isso este é um dia de festa particularmente esperado. Porque todos os portugueses, todos os católicos, todos os ambientalistas, todas as famílias, todos os viajantes passam a dispor de um caminho que foi arranjado a pensar neles, para lhes facilitar esse encontro, ou reencontro, com o essencial de que todos precisamos; a pensar em criar um novo espaço de fruição da natureza, de fruição do silêncio, de fruição do ser e do estar, como necessário contraponto a este nosso tempo em que os valores dominantes são a velocidade, a competição e a exibição; a pensar em evitar aos peregrinos os perigos e os incómodos da estrada e a pensar em devolver às pessoas em geral o gosto pelo convívio com Deus, consigo próprias, com a família, com os amigos, com o país real, tão bonito e tão desconhecido e mal tratado. Maltratado, em grande parte, porque desconhecido. Ninguém luta pelo que não conhece, pelo que não experimentou, pelo que não pôde descobrir que é bom, sejam autarcas, sejam cidadãos.
Mas é também dia de festa porque este foi um gigantesco trabalho de equipa bem sucedido. Em Portugal, onde reina a cultura das "quintas" e das "capelinhas", ver uma obra surgir da articulação dos meios de poderes nacionais e locais, de públicos e privados, de colectivos e de indivíduos é razão de festa. E a verdade é esta: isto não se fez sem um enorme e continuado esforço da equipa executiva do CNC – que trilhou estes 129 km vezes sem conta – a estudar, a definir e depois a verificar, a sinalizar, a incitar, a esclarecer. Um obrigado especial – porque a sua teimosia e dedicação o merecem – à Ana Paula Januário, ao Lourenço de Almeida, ao James Risso-Gill e ao João Junqueira. E também ao Jorge Arnoso e à Maria Antónia Vasconcelos. Mas a verdade (e julgo poder falar em nome de todos eles) é que voltaríamos sem hesitação a fazer o mesmo. Porque se aprendeu muito e se vai poder aplicar o que se aprendeu e porque se criou mais um instrumento de qualificação do país. E Portugal precisa muito de aprender boas práticas para aplicar e reproduzir e precisa muito de requalificar o seu território e o seu modo de vida em geral. Nós somos neste momento na Europa o país com mais potencial desperdiçado, porque o progresso por cá se faz ainda no sentido de destruir qualidade e não no de conservá-la ou recuperá-la.
O Caminho do Tejo fica a partir de hoje à disposição de quem o quiser percorrer em total liberdade. Termina aqui o papel do CNC, já que o CNC não é organizador de peregrinações e a sua manutenção passa a ser tarefa das respectivas autarquias. Deixamos o Guia do Peregrino como ferramenta para quem quiser percorrer o caminho sabendo melhor o que faz porque o Guia, além de indicar o itinerário pedestre com todo o pormenor, fala do património construído e do património natural – as quintas, as casas, as igrejas, a fauna, a flora – que se vai encontrando.
Vamos ter oportunidade de ver o primeiro Caminho de Fátima abençoado pelos bispos das três dioceses que são atravessadas pelo Caminho do Tejo. É um momento de alto significado para todos nós porque, se não se congregarem as forças do espírito e as forças do século, a harmonia não reinará. Ao Senhor Patriarca de Lisboa, ao Senhor Bispo de Leiria/Fátima e ao Senhor Bispo de Santarém o nosso obrigado por terem querido reforçar o sentido desta ocasião.
O Senhor Presidente da Câmara do Cartaxo, concelho onde nos encontramos, aceitou dirigir-nos umas palavras em nome de todos os autarcas presentes que contribuíram para as obras do Caminho, sem o empenhamento dos quais ele não se teria feito. Um obrigado, ou mais que obrigado, os nossos parabéns pela lucidez com que as Câmaras aceitaram entregar-se à tarefa.
O representante da Companhia de Seguros Bonança falará em nome dos mecenas privados – que são, além da seguradora, as Selecções – que produziram o Guia – e a Fundação Cidade de Lisboa.
Agradecemos a presença de Suas Excelências o Núncio Apostólico e o Embaixador de Portugal no Vaticano e de todos os representantes de departamentos públicos, de empresas e de instituições de Fátima – Santuário, Mensagem – que deram o seu contributo. A todos o devido reconhecimento que se encontra também consagrado em letra de forma no Guia do Peregrino.
A inauguração deste Caminho foi guardada para este mês por coincidir com a visita do Papa a Fátima. Sabemos quanto o Papa guarda Fátima no seu coração e estamos certos de que, quando chegar ao seu conhecimento a abertura deste Caminho de Fátima, ele terá também um lugar no seu coração.
Não foi possível, como era legítimo esperarmos, ir oferecer ao Papa pessoalmente o estojo que preparámos para ele com o Guia do 1º Caminho de Fátima. Mas há uma outra dimensão que não a visível em que as coisas se passam. E nessa, lá estaremos no dia 13 a pedir ao Papa, olhos nos olhos, que abençoe o Caminho de Fátima.
Obrigado, em nome do CNC, pela presença de todos. E boa caminhada.
9 de Maio de 2000, na inauguração do Caminho do Tejo